Nada faz sentido quando afirmamos um sentido para tudo
- Marcelo Kassab
- 1 de abr. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 3 de abr. de 2023
O sentido da vida está no mundo e em como ocupamos esse espaço...
Conforme o tempo se esvai, o ser humano tende a questionar-se mais seriamente sobre si e o que o cerca. Por que estamos aqui? Viemos para este mundo com uma missão? Qual? Como descobri-la? De que modo nós devemos proceder e viver, se a única certeza de que temos é a morte, cuja data não está visivelmente fixada no nosso calendário? Vale a pena esse esforço?
Inúmeras reflexões nos assolam e, destarte, os olhares se voltam para as entrelinhas do mundo. Nossas relações externas e conosco tomam outra dimensão na busca de atributos que se mostrem para além do superficial.
Não basta entendermos — através das descobertas científicas — o funcionamento do cérebro e do corpo ou como o universo atua. Tal pragmatismo nos alija de algo mais relevante: como devemos nos direcionar perante aquilo que nos é apresentado? E qual o significado atribuído à vida?
Obviamente, este texto não trará respostas prontas para o sentido da existência — afinal, como seres individuais, nós temos rotas diversas quando o assunto é sentido, ainda mais o da vida —, mas intenciona discutir alguns caminhos para que tal reflexão se faça.
É quando a Filosofia (novamente) é de grande valia, pois nos auxilia na análise das linhas temporais que percorrem, cruzam e marcam a nossa história. Pensadores e pensamentos se sucedem, problematizando, argumentando e aprofundando raciocínios que impactam diretamente o nosso modo de viver.
No contexto filosófico antigo, o universo segue um logos que unifica e ordena o que existe. O mundo seria algo harmônico com beleza e justiça, trazendo uma hierarquia dentro de uma realidade organizada. Por essa percepção, utiliza-se o termo kosmos. Assim, o sentido da vida — para os antigos — está no mundo e em como ocupamos esse espaço. Aqui, destacamos a impessoalidade desse logos.
Mas, na Filosofia os argumentos são torrentes. Novas eras surgem e, com essas, conceitos são alterados, descartados ou recebem novos trajes.
Chegamos à Idade Média. A ordem cósmica permanece com sua organização, harmonia e hierarquia. Porém, sob a batuta de um grande personagem: Jesus Cristo.
Reparem que o filho de Deus passa a ser o logos e a fé é a guia para as respostas sobre o sentido da vida. A religião cristã delimita uma área de atuação humana inserida nas crenças professadas pelos princípios do dogmatismo.
Conforme nos aproximamos da Modernidade, observamos o rompimento com os preceitos embutidos no Cristianismo, bem como a ressonância do Racionalismo como fonte libertadora do homem em relação aos seus dogmas. A racionalidade, então, é vista como elemento essencial para que o indivíduo seja livre. Aqui, o antropocentrismo é a pedra angular de uma época. Desse modo, o ser humano passa a ser o centro de qualquer valor contido no universo.
Eis que o Pós-Modernismo traz Nietzsche e este afronta tudo aquilo apresentado até agora. O filósofo ataca a Filosofia e a fé, sob o pretexto de destruir ídolos que subjuguem o real. Deus e o homem estão na berlinda. O mundo é caótico e o sentido da vida não está na ordem cósmica, ou na divindade. O sentido da vida deve ser encontrado aqui, nesse espaço que chamamos de mundo, dentro do que nos apresenta o real. A realidade é o que interessa e somente a ela é devida relevância.
O século XX traz os conceitos de essência e existência. Para filósofos como Heidegger e Sartre, só conseguimos pensar no sentido da vida quando existimos. A nossa essência é desnuda pela existência.
Segundo Sartre, em seu existencialismo ateu, somos livres e responsáveis pelos caminhos que escolhemos, porém, dentro da situacionalidade que a realidade nos apresenta. Devido à inexistência de Deus, o sentido da vida é descoberto pelo homem na sua existência, mediante condições apresentadas a ele. O mais importante é como procedemos conosco e com o mundo diante das situações evidenciadas.
Nossas angústias repousam em "por quês’’ insolúveis. Podemos procurar explicações na impessoalidade do universo ou na pessoalidade do Cristo, através da fé. Para os que creem na continuidade da vida após a morte, o sentido deste mundo pode ser o preparo para o devir. E para os que não creem, o sentido — caso exista — deve ser encontrado aqui, durante a trajetória terrena. A partir disso, vemos o quão importantes são as crenças para a maneira de como direcionamos as nossas vidas. Talvez, o sentido seja um pouco do todo abordado, centrado no próprio homem, seus credos e na liberdade das suas ações de acordo com o contexto em que está inserido.
Freud (em "O Mal – Estar na Civilização”) argumenta sobre a busca da felicidade como o sentido da vida humana. Podemos, então, definir felicidade de modo unívoco? É possível ser plenamente feliz, sabendo que jamais teremos tudo o que desejamos — já que os prazeres são fugazes — indo de encontro à felicidade plena e duradoura? Se houvesse uma mensuração desses prazeres, todos seriam hierarquizados do mesmo modo para todas as pessoas? Mais uma vez, as individualidades não permitem o uníssono.
Assim, retorno a Sócrates, que clamava pela necessidade de uma vida refletida, as respostas podem se resumir a buscas e reflexões sobre a existência e desaguarem em decepcionantes aporias.
O caminho que vislumbra o sentido da vida, certamente, é oposto ao pragmatismo objetivo. Talvez, a sabedoria esteja na incessante procura e no caminhar insistente em direção a essas respostas, mesmo sabendo que estas podem habitar o inatingível.
E você, já pensou sobre o que lhe trouxe até aqui?
Marcelo Kassab.
Escritor e Cirurgião dentista.
Nota: Você também pode encontrar essa temática em artigos de outros escritores do portal Filosofar a Vida, a partir dos links abaixo:
Artigo: "Série: Em busca de uma finalidade | Cap. 01" (Anderson Cruz)
Artigo: "O sentido da vida" (Antelmara Silva)



